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Demência frontotemporal

Por: Dra. Joana Azevedo Oliveira

A demência frontotemporal é uma síndrome clínica que envolve alterações comportamentais relacionadas à atrofia dos lobos frontais e temporais. Assim como na doença de Alzheimer e na demência com corpos de Lewy, trata-se de um quadro degenerativo progressivo sem causas específicas, mas que envolve predisposição genética.

Importante esclarecer que o termo “demência”, na compreensão médica, tem um sentido diferente do que é conhecido pelos leigos, que acreditam se tratar de um tipo de loucura. Em medicina, demência representa a degeneração crônica, contínua e irreversível da cognição. As funções cognitivas abrangem: memória, linguagem, atenção, percepção e capacidades executivas.

A demência frontotemporal normalmente afeta pacientes mais jovens que nas outras patologias geriátricas, podendo iniciar ainda na faixa dos 50 anos, mas com maior incidência entre 60 e 65 anos. As alterações desse quadro incluem atrofia grave, perda neuronal e presença de neurônios anormais, o que desencadeia sintomas bem específicos, como desinibição repentina, impulsividade, agressividade e outros distúrbios comportamentais — além dos comprometimentos cognitivos, como nas outras demências.

Causas e fatores de risco

A demência frontotemporal é decorrente de causas hereditárias e a as mutações ocorrem no gene codificador da proteína tau. O acúmulo dessa proteína, quando alterada, é associado ao início ou à progressão dos quadros neurodegenerativos.

Afora os componentes hereditários, não existem causas bem esclarecidas que provoquem o desenvolvimento da demência frontotemporal. Portanto, os principais fatores de risco são: histórico familiar de demência; idade entre os 50 e 65 anos; sexo feminino — a doença é mais comum em mulheres, mas também pode afetar os homens.

Sintomas

Os pacientes com demência frontotemporal dificilmente percebem que estão passando por alterações. São os familiares que começam a notar o comportamento atípico. Os principais sintomas são:

  • desinibição;
  • comportamento antissocial;
  • agressividade;
  • desatenção;
  • apatia;
  • perda de empatia;
  • comportamentos compulsivos;
  • hiperoralidade (compulsão por colocar objetos na boca);
  • hipersexualidade (comportamentos de depravação);
  • distúrbios de personalidade.

A desinibição e o comportamento antissocial são os sintomas mais precoces observados pelas pessoas próximas ao paciente. A apatia e a falta de empatia são sinais frequentes desse tipo de demência e estão entre as características que mais incomodam os familiares e cuidadores.

São duas características distintas: apatia significa desânimo, indiferença, já a falta de empatia é incapacidade de se colocar no lugar do outro. Isso se reflete na dificuldade para reagir de forma adequada em situações que envolvem relações interpessoais — prejuízos nessa capacidade são um ponto marcante da demência frontotemporal.

Estereotipias e comportamentos ritualizados também são manifestações comuns desse tipo de demência. Em muitos casos, os prejuízos cognitivos são mais evidentes na linguagem do que na memória, em comparação com o que ocorre na doença de Alzheimer. Aspectos relacionados às funções executivas, como a perda da capacidade de planejamento, tendem a se agravar conforme a condição progride.

Ao que revelam os exames de neuroimagem, os pacientes com comprometimento do hemisfério direito do cérebro apresentam alterações comportamentais mais graves.

Diagnóstico

O diagnóstico requer avaliação clínica aprofundada, a fim de esclarecer quais são os comportamentos atípicos mais evidentes, considerando a personalidade do paciente antes das manifestações da demência frontotemporal.

Uma investigação diagnóstica geral para quadros de demência exige o levantamento dos sintomas cognitivos e neuropsiquiátricos, os quais interferem na capacidade funcional do paciente. Também são aplicados exames do estado mental, dentre eles o Mini-Mental, que avalia o nível de comprometimento da memória.

A lista de instrumentos de avaliação das demências e de outras patologias geriátricas é ampla. O primeiro atendimento em geriatria costuma ser demorado e os familiares são importantes nesse cenário, uma vez que podem intermediar a comunicação e ajudar o médico a coletar todas as informações que precisa — principalmente quando o estado cognitivo do paciente já se encontra prejudicado.

No amplo leque de dados, o médico precisa saber sobre:

  • funcionalidades — funções básicas associadas ao autocuidado e à sobrevivência que o paciente consegue desempenhar sem ajuda (exemplo: ir ao banheiro e alimentar-se);
  • atividades instrumentais que permitem a manutenção da vida diária em comunidade, como usar o telefone e administrar as próprias finanças;
  • doenças existentes;
  • medicamentos de uso diário;
  • histórico de eventos clínicos graves, como infarto e AVC;
  • história familiar de patologias geriátricas, câncer e outras condições que requeiram atenção;
  • condições nutricionais do paciente;
  • hábitos de vida;
  • características da vivência atual — com quem mora, se tem autonomia financeira etc.;
  • situação da vacinação.

A lista de informações investigadas na anamnese segue além destas. Cada questão é importante para compreender quem é esse paciente e como intervir para melhorar sua qualidade de vida. O atendimento em geriatria não é focado somente no tratamento pontual das patologias identificadas, mas baseia-se em uma visão total do paciente, com a finalidade de prolongar sua saúde e seu bem-estar físico e mental, dentro do possível.

No diagnóstico da demência frontotemporal, em específico, a avaliação neuropsicológica e comportamental focaliza indícios de disfunção executiva e déficits de julgamento crítico e social. Nesse contexto, algumas ferramentas são úteis, como a bateria de avaliação frontal (FAB), a bateria de avaliação da cognição social e emocional e o inventário de comportamentos frontais.

Exames de neuroimagem também são importantes para a definição da demência frontotemporal provável — assim como na doença de Alzheimer, a condição é definida como possível ou provável. Os exames indicados são tomografia computadorizada, ressonância magnética do crânio, tomografia por emissão de fóton único e tomografia por emissão de pósitrons.

Tratamento

As demências degenerativas ainda não têm tratamento para reverter os danos ou impedir a progressão da deterioração cognitiva. Contudo, algumas intervenções podem ajudar no manejo dos sintomas comportamentais.

Na demência frontotemporal, existe um acentuado déficit de serotonina. Diante disso, alguns estudos identificaram benefícios no uso de antidepressivos inibidores seletivos da recaptação de serotonina. A melhora foi percebida principalmente em relação aos sintomas de irritabilidade, impulsividade e comportamentos compulsivos.

A orientação aos familiares quanto à maneira de lidar com as alterações comportamentais do paciente é essencial no apoio ao tratamento. A atenção ao estresse dos cuidadores também é importante, visto que a demência frontotemporal e as demais patologias geriátricas podem impactar todos os membros da família, de uma forma ou outra.